Entrevista com Ana Maria, mãe de Pedro Henrique

O ativista de direitos humanos, Pedro Henrique Santos Cruz, foi assassinado aos 31 anos, em 27 de dezembro de 2018, de forma brutal e covarde por policiais militares da PM-BA dentro de sua casa, no bairro Nova Esperança, em Tucano, cidade no sertão da Bahia. Pedro foi o criador da “Caminhada pela Paz”, movimento social contra a brutalidade policial em Tucano (BA), era artista visual e se identificava com a cultura rastafari, começando sua militância contra o terrorismo de Estado e a violência policial em 2012, após ser agredido por policiais. Os PMs acusados de executar Pedro Henrique com 8 tiros, reconhecidos por uma testemunha, permanecem impunes. A Casa da Resistência entrevistou a companheira Ana Maria Cruz, mãe de Pedro, nesses dois anos do assassinato de seu filho e luta por justiça. Casa da Resistência: Ana Maria, primeiro parabenizamos sua luta incansável por justiça para Pedro Henrique, exemplo de combate ao terrorismo de Estado no país e aos crimes dessa instituição genocida que é a Polícia Militar da Bahia. Gostaríamos de saber como tem sido esses dois anos da perda de Pedro e a luta dos seus familiares e amigos por justiça? Ana Maria: Agradeço o apoio e a força que todos vocês me dão desde o início, ao longo desses dois anos e eu quero dizer que não há mérito nenhum em lutar por um mundo mais justo, é nossa obrigação, queria eu ter o fôlego de Pedro que dedicou os últimos anos de sua vida a defender o bem, o amor, a paz e a justiça. Tenho certeza de que estes foram os melhores anos de sua vida, sofrimento nenhum pelo qual ele passou vai conseguir tirar essa grandeza do espírito combativo e guerrilheiro do nosso Pedro, muito menos o seu sorriso e o seu amor à vida. Dois anos sem a presença de Pedro, dois anos de luta sem trégua. Não podemos dormir, nem cochilar podemos, a luta de Pedro vive reclamando, dentro de nós uma reação à injustiça a ele imposta e não podemos sequer sonhar em desistir. Não seria justo com ele, não seria justo com todas as vítimas desses assassinos covardes, temos um longo caminho pela frente. Medo todos temos por que somos humanos, mas acreditamos que a continuidade da luta por justiça é bem maior que todo e qualquer temor e é este sentimento que nos encoraja e nos impulsiona. Uma coisa eu sei: eles têm muito mais medo de nós do que nós deles. Esta é a grande diferença, daí o motivo de armarem-se contra nós, desarmados, somos corpos que tombam, mas somos ideias que reverberam e se propagam e quanto mais nos matam, mais longe vão nossos pensamentos, mais pessoas abraçam nossa causa. Não vamos desistir. Viver sem Pedro não existe. Um dia me perguntaram pelo luto e eu respondi que não tive tempo de viver o luto e nem de chorar por Pedro. Me inspiro na namorada dele, uma jovem guerreira. Quando cheguei no final da manhã do dia 27 de dezembro na casa de Pedro em Tucano, o IML já havia removido o corpo, a perícia já tinha sido feita e a casa estava lavada, limpa, cheirosa, impecável. Percebi um filete de sangue que escorria do ouvido direito dela, consequência do coturno de um dos assassinos que pisou em sua cabeça, imobilizando-a de encontro ao chão, enquanto ele e mais dois atiradores disparavam suas armas contra Pedro que já estava caído sobre a cama, então eu perguntei por que ela não havia cuidado daquele ferimento. A garota simplesmente me respondeu: “Tinha muita coisa pra eu fazer aqui antes de você chegar”. Foi uma das maiores lições e exemplo de força, amor e bravura que eu já tive. Retomando, viver sem Pedro não existe. Ele está o tempo todo ao nosso lado, lutando, nos encorajando a continuar e quanto mais eu luto, mais sinto ele próximo de mim. É ele quem não me deixa desistir. Casa da Resistência: Em qual situação encontra-se a investigação, o que explica a situação de impunidade dos policiais que assassinaram Pedro? Existem ameaças ou risco a você, sua família e amigos de Pedro Henrique? Qual o papel do governo do Estado da Bahia, do comando da polícia militar, do ministério público e da justiça baiana? Ana Maria: As investigações, no âmbito da polícia civil, terminaram, o inquérito foi concluído indiciando apenas dois dos três atiradores. Os autos foram devolvidos ao MP, sem que a diligência requerida pelo promotor fosse cumprida, em que constava submeter o terceiro atirador a reconhecimento feito pela testemunha ocular do crime. Para isso, o acusado alegou estar de quarentena por conta de haver uma suspeita de Covid-19, mas a audiência de reconhecimento estava marcada para o dia 2 de julho de 2020, de lá até 13 de novembro, data em que o inquérito voltou para o MP, foram mais de quatro meses que os autos permaneceram em poder da autoridade policial sem que nova audiência de reconhecimento fosse marcada. Estamos no aguardo de que o Ministério Público ofereça a denúncia contra os PMs autores do crime. A situação de impunidade permeia do início ao fim. Os assassinos de Pedro foram reconhecidos no momento em que o executaram, o fato foi imediatamente levado ao conhecimento da Corregedoria Geral e da Polícia Civil, mas em momento algum os autores foram afastados ou tiveram suas prisões decretadas, não tiveram suas armas apreendidas para perícia, tampouco foram submetidos a exames de pólvora combusta. O risco que corremos é constante e iminente, mas isso não muda nada a minha determinação de continuar a luta de Pedro e por Pedro. As ameaças são veladas, com olhares, atitudes, abordagens intimidatórias a amigos de Pedro e, principalmente, várias tentativas de me silenciar através de representações nos juizados criminais, não de Tucano, mas estrategicamente, nas comarcas das cidades de Euclides da Cunha e Salvador, dizendo-se eles vítimas de calúnias. Atribuo essa situação de impunidade ao medo, conivência e conveniências. Muitos interesses escusos moveram esses criminosos a praticar tamanha atrocidade e acredito