Declaração Internacional sobre o encontro Trump/Bolsonaro na Casa Branca

DERROTAR O NEOFASCISMO E O IMPERIALISMO COM A LUTA POPULAR REVOLUCIONÁRIA, ANTICAPITALISTA E INTERNACIONALISTA Neste dia 19 de março acontece na Casa Branca, em Washington (DC), acontece a cúpula reacionária entre os presidentes dos EUA e do Brasil, Donald Trump e Jair Bolsonaro são representantes da escalada global do neofascismo, produtos da apodrecida democracia burguesa e da ofensiva imperialista e supremacista branca sobre os povos do mundo, para aprofundar a dominação, exploração e subjugação da classe trabalhadora e dos povos oprimidos. O objetivo desse encontro entre as bestas racistas das Américas do Norte e do Sul é ampliar a subserviência do Brasil aos EUA e a ingerência imperialista sobre a América Latina, no contexto da guerra comercial com a China e da ameaça de invasão militar sobre a Venezuela. O governo Bolsonaro institucionalizou no Brasil um Estado policial, genocida e ultraliberal que avança contra os direitos básicos da classe trabalhadora brasileira e promove massacres contra o povo negro nas favelas, ataca camponeses pobres e povos indígenas, mulheres e LGBT’s. Assim como o governo Trump, a gestão desastrosa e patética de Jair Bolsonaro se sustenta em setores neofascistas, corruptos e criminosos, no supremacismo branco e em um discurso conservador, reacionário e neonazista. Como organizações populares revolucionárias dos EUA e do Brasil, repudiamos a cúpula reacionária entre Donald Trump e Jair Bolsonaro, que submete o Brasil ainda mais ao papel de capacho dos EUA na América Latina para fazer avançar os objetivos da guerra imperialista do governo Trump contra os povos do mundo. Acreditamos que apenas a auto-organização popular, a luta internacionalista e o enfrentamento revolucionário contra os governos reacionários podem derrotar o neofascismo e o imperialismo. Convocamos revolucionários/as de todo mundo para repudiar e realizar ações contra as visitas da agenda internacional de Jair Bolsonaro também no Chile (22 e 23 de março) e em Israel (31 de março). DEFEAT NEOFASCISM AND IMPERIALISM WITH THE REVOLUTIONARY, ANTICAPITALIST, AND INTERNATIONALIST FIGHT On March 19, the reactionary leadership of the US and Brazil, led by presidents Donald Trump and Jair Bolsonaro, are meeting in Washington, D.C. As representatives of the global escalation of neofascism, these products of the rotten bourgeois democracy, the imperialist offensive, and white supremacist ideology seek to deepen the domination, exploitation and subjugation of the working class and the oppressed peoples of the world. The objective of this meeting between the racist beasts of North and South America is to expand Brazil’s subservience to the US and its imperialist interference with Latin America in the context of the trade war with China and the threat of military invasion of Venezuela. As we have seen in the past, when far right governments conspire it is always the poor, and the socially maligned who suffer most. The Bolsonaro government has institutionalized a genocidal and ultraliberal police state in Brazil that advances against the basic rights of the Brazilian working class, promotes massacres against the black people in the favelas, and attacks peasants and indigenous peoples, women and LGBT+ people. Like the Trump government, Jair Bolsonaro’s disastrous and pathetic management relies on neo-fascist, corrupt and criminal sectors; white supremacism; and conservative, reactionary, neo-Nazi discourse. As popular revolutionary organizations in the US and Brazil, we repudiate the reactionary leadership between Donald Trump and Jair Bolsonaro, which subjects Brazil even more to the role of US doormat in Latin America in advancing the objectives of the Trump government’s imperialist war against the peoples of the world. We believe that only popular self-organization, internationalist struggle, and revolutionary resistance against reactionary governments can defeat neofascism and imperialism. We call on revolutionaries from all over the world to repudiate and take action against Jair Bolsonaro’s international agenda visits also in Chile (March 22-23) and Israel (March 31). Revolutionary Abolitionist Movement (RAM)Casa da Resistência – FOB Março de 2019, Brasil-EUA.

Caderno Militante da Casa da Resistência [2015-2019]

Reunimos neste Caderno Militante documentos, análises, declarações e textos produzidos pela Casa da Resistência entre o segundo semestre de 2015 e primeiro semestre de 2019, período da retomada do nosso projeto militante, que no próximo dia 28 de abril deste ano completa 10 anos. São textos militantes publicados em diferentes meios, nossos ou de parceiros, não necessariamente em ordem cronológica, que servem para orientar nossa militância, para o debate coletivo desde uma perspectiva revolucionária e anticolonial e para apresentar nossos posicionamentos e definições básicas para irmãos e irmãs interessados em conhecer, integrar e passar pelo processo de formação de nosso centro de cultura e luta autogestionário, ao fim, indicamos leituras complementares de livros e publicações que editamos ou coeditamos, e as teses do II ENOPES (Encontro Nacional de Oposições Populares, Estudantis e Sindicais) quando passamos também a construir a Federação das Organizações Sindicalistas Revolucionárias do Brasil – FOB. Sumário do Caderno Militante: • Pontos de Unidade da Casa da Resistência • Feira de Santana: Construir Resistência Popular e Enfrentar a Barbárie Ronaldista • Não Vote, Reaja: Boicotar a Farsa Eleitoral da Supremacia Branca • Manifesto Incendiar a Casa Grande, Construir a Rebelião! • Quilombo Lucas da Feira Resiste! • Por uma Greve Geral Insurrecional Contra as Reformas Neoliberais e o Genocídio do Povo Negro • George Américo e a Epopeia Sem-teto • Matança, Violência e Genocídio na Bahia • Manifesto da Campanha Não Vote, Lute! • O Poder do Povo vai fazer um Mundo Novo: Construir uma Alternativa Popular e Revolucionária • Sobre Calúnias e Tentativas de Criminalização • Você Não Está Sozinho! Justiça para Pedro Henrique! • Leituras Complementares.

Você não está sozinho! Justiça para Pedro Henrique!

Militante que denunciava a violência policial, Pedro Henrique foi brutalmente assassinado após sofrer uma série de ameaças e agressões de policiais militares, na cidade de Tucano (Bahia). Denunciamos a Polícia Militar da Bahia como uma instituição racista, criminosa e assassina, e o terrorismo de Estado do governo genocida de Rui Costa e seu secretário de segurança pública Maurício Teles Barbosa. Na madrugada do dia 27 de dezembro de 2018, três homens encapuzados invadiram a casa de Pedro Henrique Santos Cruz Souza, de 31 anos, enquanto ele dormia no bairro Nova Esperança (conhecido como Matadouro), em Tucano (sertão da Bahia), se identificaram como policiais, o deram voz de prisão, o obrigaram a deitar em um colchão e o executaram sumariamente pelas costas com oito tiros de pistola na cabeça, roubaram seu celular e em seguida fugiram em um veículo prata. Familiares ouvidos pela investigação aberta pela Polícia Civil e pelo Ministério Público da Bahia (MP-BA), apontam que antes de chegarem na casa de Pedro, os assassinos invadiram a casa do seu pai, de 68 anos, e o obrigaram a dizer onde o filho estava, a testemunha do assassinato brutal em depoimento à Corregedoria Geral da SSP-BA, identificou pelas características físicas e tom voz dois policiais militares, citando seu nomes, envolvidos também em outras abordagens violentas contra Pedro Henrique e que teriam o ameaçado dois dias antes em um mercado local, além de um terceiro policial que sempre estaria em companhia desses dois. [ver glo.bo/2Sq2TNG e glo.bo/2WEEHXw] Pedro Henrique era organizador da Caminhada da Paz contra a violência policial na cidade de Tucano, identificado com a cultura rastafari, trabalhava como artesão e tatuador, e militava pelos direitos humanos. Desde o final do ano de 2012, Pedro vinha sofrendo uma série de abordagens truculentas, ameaças e agressões por agentes da repressão de Tucano, denunciando ao Ministério Público diversas essas ações. Em 2013 iniciou a organização da Caminhada da Paz, com o objetivo de denunciar as ações violentas e criminosas da Polícia Militar, incluindo a “Chacina de Tucano” quando cinco jovens da periferia da cidade foram arrancados de suas casas, torturados e assassinados em junho de 2015. Após VI Caminhada da Paz, última organizada por Pedro, em maio de 2018 onde policias militares tentaram aterrorizar e amedrontar manifestantes pacíficos, as abordagens violentas aumentaram e após uma invasão ilegal de sua casa em outubro de 2018, por polícias e guardas municipais, Pedro foi conduzido e preso por cultivar alguns pés de maconha no seu quintal para consumo próprio, sendo liberado da falsa acusação de tráfico de drogas em menos de 24h, após esse episódio as ameaças vindas de policiais aumentaram, e cumprindo essas ameaças Pedro Henrique foi brutalmente assassinado em 27 de dezembro de 2018. Pedro Henrique foi vítima do terrorismo de Estado, executado sumariamente, segundo testemunha, por agentes da Polícia Militar da Bahia, uma tropa neocolonial e neonazista que assassina todos os dias pretos e pobres como baratas, destrói vidas e famílias aos milhares todos os anos, tudo com o aval do governador genocida Rui Costa (PT) e as ordens do carniceiro e secretário de segurança Maurício Teles Barbosa. Não devemos ter nenhuma confiança na justiça burguesa e na investigação do Estado sobre seus próprios crimes, como prova o caso de Marielle Franco e tantos outros. Devemos exigir o fim da Polícia Militar, essa instituição criminosa, e construir nossos próprios organismos de segurança e autodefesa. É necessário e urgente ampliar e construir as organizações de base do povo e uma cultura de segurança militante, que projeta nosso povo e seus lutadores e lutadoras. A luta por justiça e paz de Pedro Henrique deve seguir, sua voz deve ser ampliada. A justiça popular deve cobrar a todos os carrascos do povo e os robôs do Estado, da supremacia branca e do capital. Não temos tempo para ter medo. Convocamos todas as organizações populares, grupos, coletivos e movimentos para ampliar essa denúncia e para garantir o suporte aos familiares e amigos/as de Pedro Henrique, assim como, apoiar a realização da VII Caminhada da Paz, em 2019, com a palavra de ordem sugerida por ele: VOCÊ NÃO ESTÁ SOZINHO! PEDRO HENRIQUE VIVE E VENCERÁ!CONTRA O TERRORISMO DE ESTADO E O FASCISMO INSTITUCIONAL!CONSTRUIR O PODER DO POVO E A AUTODEFESA POPULAR! 2 de fevereiro de 2019, Bahia, Brasil.

Matança, violência e genocídio na Bahia

Sangue escorrendo nas ruas, corpos alvejados e dezenas de famílias destruídas. O saldo da matança que fez Feira de Santana viver um clima de terror entre a tarde do último sábado e a noite de domingo é de 17 homicídios segundo os dados oficiais subnotificados, mas com informações dando conta de pelo menos 21 assassinatos nesses dois dias, que ocorreram na sequência da morte de um policial militar, após a tentativa de evitar um assalto na saída de uma festa na madrugada de sábado. Pedra do Descanso, Rua Nova, Campo Limpo, SIM, Sítio Mathias, Cordeirópolis e outras comunidades pobres e de maioria negra registraram mortes violentas, a maioria com características de execuções sumárias, típicas da ação de grupos de extermínio que operam por dentro da Polícia Militar da Bahia, entre as vítimas estão menores de idade, quase todos jovens negros e boa parte sem antecedentes criminais, repetindo o fim de semana de terror em Salvador e região metropolitana onde foram registrados 31 assassinatos (segundo os dados oficiais), também após a morte de um policial. O revide policial, onde policiais produzem matanças como forma de vingar a morte de algum outro policial, se tornou uma normativa no acionar das policiais militares, e para além de acusar grupos de extermínio que operam clandestinamente como organizações paramilitares de extrema-direita, é preciso afirmar o óbvio, a própria Polícia Militar como instituição e tropa neocolonial que conduz uma guerra reacionária e racista contra o povo é em si, um grupo de extermínio. O governo de Rui Costa (PT), o fascista que governa a Bahia em uma gestão supostamente de “esquerda”, em aliança com reacionários de toda espécie e sob o manto de lideranças corrompidas e movimentos cooptados, deu sequência e ampliou uma política de “segurança pública” genocida e criminosa, colocando a Bahia nas primeiras posições de todos os quadros estatísticos nacionais e internacionais de homicídios e letalidade policial, mesmo com o governo e a secretaria de segurança pública tentando esconder e camuflar os registros de assassinatos. Maurício Teles Barbosa, o carniceiro e responsável direito pelo holocausto e guerra racial que se produz no estado, atravessou os governos Jaques Wagner e Rui Costa na pasta da segurança e é provavelmente o secretário de segurança pública com mais mortes em uma gestão de secretária na história recente, com números reais que ultrapassam as 30 mil mortes. A brutalidade policial que se justifica falsamente em um mentiroso combate ao tráfico de drogas e facções criminosas, produtos do narcoestado, é na verdade um mecanismo racista de controle militar e guerra contra um povo desarmado que se relaciona diretamente com a negação de direitos sociais, a dominação burguesa e a ofensiva neoliberal, conectado diretamente com a manutenção dos níveis de exploração e superexploração da classe trabalhadora e do proletariado marginal, ou seja, a guerra racial que atinge a maioria negra é um instrumental brutal e bárbaro necessário ao capitalismo em crise, que amplia suas formas de domínio e controle através da necropolítica. Na Bahia, em termos concretos, isso se traduz no maior índice de desemprego do país, e ao mesmo, no maior número absoluto de assassinatos. É necessário denunciar e enfrentar o governo de Rui Costa e sua política de segurança racista e genocida, sustentada por chacinas, massacres e terrorismo racial. É urgente levantar uma campanha contra o terrorismo de Estado e em defesa da vida do nosso povo, reafirmando os métodos combativos e a independência para combater qualquer que seja a gerência do Estado burguês e supremacista, assim como, romper qualquer ilusão com o canto da sereia vindo da linha auxiliar e suas distrações, que também é responsável por sustentar esse governo. A Polícia Militar tem que acabar, uma corporação brutal e racista cuja função é conduzir uma guerra contra o povo não pode ser reformada ou humanizada. Organizar nosso povo e construir organismos de autodefesa popular, como nos mostra a experiência das polícias comunitárias e indígenas no México, continua sendo a única tarefa e saída possível para pôr fim ao massacre e a guerra reacionária, e como diz a rima do Contenção 33, “mostrar pros fí de Hitler que o gueto sabe dar o troco”. 

GEORGE AMÉRICO E A EPOPEIA SEM-TETO

Como hoje, era um 5 de maio de 1988, Feira de Santana amanhecia com a notícia do assassinato a tiros do seu maior organizador e líder de massas. George Américo é o fundador da cidade que conhecemos, a geração que nasceu quando George deixou de ser o “rei das invasões” e se tornou mártir, a Feira de Santana periférica, de sofrimento, pobreza e resistência, a cidade-encruzilhada, formada por gente que veio de todo canto e foi ocupando terra e se amontoando entre barracos, taboas, guetos e bairros proletários. Nos anos 80, George organizou 21 ocupações rururbanas, locais híbridos entre a cidade excludente de urbanização conservadora e os caminhos rurais. A geração que nasceu quando George morreu é filha da geração que carrega o “bandido” que ocupava terras no coração, com a gratidão merecida ao líder das ocupações que garantiram à muita gente a conquista de um pedaço de terra e um teto, ou como dizem os versos da poesia-monodia da canção de Gilsam: “George Américo guerreiro-menino, George Américo sonho peregrino, teu peito foi feito em paredes, nas ruas da Feira esculpidas, por ti me inflamei e me inflamo, ficou tua marca na flâmula de dores, em foto e mensagem, contra esses horrores que enfrentaste como o sol se pondo”. É uma ironia trágica que hoje, nesses 30 anos do assassinato de George, assistimos a tragédia televisionada dos sem-teto do prédio ocupado no centro de São Paulo sendo utilizada pelos governos de gerentes do capital e pelo jornalismo de rapina que opera como uma agência de propaganda anti-povo para criminalizar os movimentos de luta por moradia. O crime contra George Américo nunca foi resolvido, executado a mando do poder, como foi Marielle, em outro paralelo com a conjuntura. Criminalizado pelo jornalismo da princesa-comercial, George recebeu a alcunha de “rei das invasões” e sempre foi tratado como um bandido pela mídia local, ora acusado de vender lotes, ora de manter relações com o tráfico de drogas, a mesma fórmula de assassinar reputações repetida ainda hoje para matar lutadores do povo. Quem apertou o gatilho contra George foi a grilagem de terras, a especulação imobiliária, com os nomes dos responsáveis sempre sendo sussurrados em voz baixa pelo medo ainda sentido por quem acompanhou a saga de George e sabe da crueldade dos poderosos dessa terra. Retratado como um homem rebelde e solidário, de família pobre e sempre envolvido em causas sociais, começou sua militância no movimento estudantil e fez parte da Casa do Estudante ainda em seus tempos áureos, depois foi funcionário da prefeitura, o que facilitou seu acesso as informações sobre terrenos na cidade e foi exatamente por esse motivo demitido, fundou a Associação dos Sem Teto de Feira de Santana que mantinha uma dinâmica permanente de organização e mobilização de massas e já naquela época questionava o direito à cidade, em uma das remoções feita pela prefeitura George protestava contra a lógica de alocar os ocupantes em locais distantes da cidade como solução, normalmente no “favelão do Aviário”, como se referia na época. Existem poucos e escassos registros das ocupações realizadas pela Associação dos Sem Teto, como a do bairro Santo Antônio dos Prazeres. Perseguido pelo judiciário, George foi preso e levado para Salvador, sendo logo solto. Mas foi em novembro de 1987, no local que hoje é o Conjunto Habitacional que carrega seu nome, o maior feito e o auge da trajetória política e militante de George Américo, cerca de 5 mil pessoas lideradas por ele, um exército de miseráveis e excluídos do “milagre brasileiro”, ocuparam o Campo de Aviação e antes do raiar do sol de um sábado tinham tomado uma grande faixa de terra de quase 800.000m², sendo até hoje a maior ocupação já feita em Feira de Santana, e talvez na Bahia. Era um tempo de ascenso das lutas populares e de trabalhadores, os ânimos iam se acirrando e a cidade vivia uma tensão cada vez maior entre os grupos políticos que disputavam o poder. O povo de Feira prontamente apoiava a luta dos sem-teto, e mesmo a polícia convocada para despejar a ocupação após uma ordem judicial se negou a reprimir os sem-teto. Em dezembro do mesmo ano, George sofreu um atentado e declarou em uma rádio que “mesmo morto a luta dos miseráveis não iria parar”. O guerreiro-menino já tinha se tornado um mito e herói do povo pobre feirense, circulava entre as organizações políticas de esquerda e democráticas, mas mantinha uma conduta politicamente independente. Em 5 de maio de 1988, em um crime encomendado e nunca punido, dois tiros de escopeta no peito tiraram a vida de George, seu corpo foi encontrado no rio Jacuípe, em seu enterro uma multidão tomou o centro da cidade e carregou o corpo do “Santo George”, como algumas pessoas ainda se referem ao líder sem-teto, até o cemitério e seu túmulo é ainda hoje um local de demonstração de gratidão por parte dessa gente pobre que George organizou para lutar por vida e moradia digna. Sua memória, mesmo vilipendiada por alguns, ainda segue viva e deve ser permanentemente disputada e honrada como um mártir, herói e lutador do povo da mesma terra de Lucas da Feira, Maria Quitéria e Luís Antônio Santa Bárbara, da Feira de Santana rebelde. GEORGE AMÉRICO VIVE E LUTA! MEMÓRIA E JUSTIÇA! Feira de Santana, 5 de maio de 2018. Documentário “George Américo, o Rei das Invasões” (Dir. Cristiane Melo, 25min.), narrando a trajetória do militante da antiga Casa do Estudante, que se tornou presidente da Associação dos Sem Teto de Feira de Santana e liderou mais de 20 ocupações por moradia na cidade nos anos 80, sendo a maior delas a do Campo de Aviação (atualmente Conjunto George Américo), apelidado pela imprensa de “Rei da Invasões” e criminalizado pelas elites locais ligadas a especulação imobiliária, George foi assassinado em condições nunca esclarecidas em 5 de maio de 1988, enterrado por uma multidão de trabalhadores pobres, agradecida ao lutador do povo e líder sem-teto que dedicou sua vida à luta por moradia.

O assassinato de Malcolm X e o nascimento dos Panteras Negras

Em 21 de fevereiro de 1965, domingo, Malcolm X se dirigiu para ao Audubon Ballroom, em Manhattan, para um evento promovido pela Organização para a Unidade AfroAmericana (Organization of Afro-American Unity – OAAU), um dos grupos que fundara recentemente, após deixar a Nação do Islã (Nation of Islam – NOI). O rompimento fora hostil: ao descobrir o comportamento hipócrita do líder da NOI, Elijah Muhammad, que mantivera relações adúlteras com várias jovens mulheres da organização, Malcolm o confrontara; isso havia acentuado uma tensão que já se arrastava há tempos, devido ao comportamento cada vez mais independente de Malcolm. Desde que deixara a organização, ele admitira publicamente que vinha recebendo ameaças de morte. Uma semana antes do evento, sua casa fora atingida por bombas, no meio da noite. O evento no Audubon Ballroom estava planejado para começar às duas da tarde, mas só havia cerca de 40 pessoas presentes nesse horário – inclusive um homem identificado como pertencente à NOI, sentado na primeira fila, que ostentava na lapela um pin da organização. Um dos seguranças da OAAU tentou persuadi-lo a ir para o fundo do salão; o homem reclamou e, após retirar o pin, sentou-se no mesmo lugar. Por insistência de Malcolm X, que não quisera incomodar o público, ninguém naquela noite seria revistado, e seus próprios seguranças não deveriam portar armas, à exceção do chefe da equipe. Às duas e meia, o público estava impaciente. O ministro-assistente de Malcolm na Muslim Mosque, Inc. – o outro grupo fundado por ele após deixar a NOI, de orientação religiosa – fez uma fala introdutória; quando já havia mais de duzentas pessoas presentes, perto das 3 horas, Malcolm finalmente subiu ao palco. Ele apenas proferira a saudação islâmica – “Assalamu alaikum” –, prontamente respondida pela plateia, quando houve uma confusão na sexta ou sétima fileira de cadeiras: alguém gritou “Tire suas mãos dos meus bolsos!”, e dois homens começaram a brigar. A equipe de seguranças da OAAU avançou para conter a briga, e o próprio Malcolm, deixado sozinho no palco, tentou restaurar a normalidade, gritando do palco. Nesse momento, o homem da primeira fileira se levantou, caminhou em direção ao palco, pegou uma escopeta de cano serrado escondida sob seu casaco e a descarregou na direção do líder negro. Uma quantidade imensurável de pretos estadunidenses sentiu a morte de Malcolm X como uma perda pessoal. Entre eles, estava um jovem negro que nascera em uma família pobre, no Texas, filho de um carpinteiro e de uma dona de casa, que agora estudava no Merritt College; seu nome era Robert George Seale, alcunhado “Bobby”. Para Bobby Seale, não havia dúvida: Malcolm fora assassinado pela CIA, por ordem do presidente Lyndon Johnson. Embora até hoje não haja provas nesse sentido, sabe-se que tanto a CIA quanto o FBI monitoraram por anos a vida de Malcolm X, estudando estratégias para prendê-lo e alimentando seus conflitos com a NOI; e há relatos segundo os quais Malcolm temia, de fato, que a CIA tentasse matá-lo. Revoltado, Seale reagiu da forma como era possível a um jovem preto em sua situação: saiu pelas ruas, arremessando tijolos em carros dirigidos por homens brancos. Todavia, não tardou a perceber que essa revolta solitária não passava de um gesto emocional, e se recolheu por uma semana, a fim de se recompor. Ao longo desse período, tomou uma decisão: embora também visse Martin Luther King Jr., líder na luta pelos Direitos Civis, como um herói, Seale faria de si mesmo um novo Malcolm X. Com isso em mente – e com uma cópia de Os Condenados da Terra, de Frantz Fanon, em mãos –, procurou um outro jovem negro, também estudante do Merritt College, que considerava articulado e conhecedor da história dos negros, a fim de fundar uma nova organização; seu nome era Huey Percy Newton. Nascido em Monroe, Louisiana, Huey era o mais jovem dos sete filhos de um agricultor ligado à igreja Batista. Aos 3 anos, a família se mudara para Oakland, na Califórnia, onde Newton vivera uma infância conflituosa: fora expulso de diversas escolas públicas – às vezes, de propósito, para ocultar suas próprias dificuldades de aprendizado; segundo David Hilliard, que o conheceu na adolescência, Huey conviveria com o estigma de ser considerado um analfabeto, com QI 79. Quando foi para o Merritt College, Huey finalmente começou a desenvolver confiança intelectual, tornando-se um ávido leitor de obras filosóficas e literárias – de W. E. B. DuBois a James Baldwin; de Frantz Fanon a Søren Kierkegaard. Huey também desenvolveria uma notável capacidade para decorar a localização de passagens em páginas e parágrafos de livros. Bobby Seale encontrara Huey pela primeira vez no início dos anos 1960, em uma das manifestações de rua contra o embargo dos Estados Unidos a Cuba, e ficara impressionado com sua capacidade de argumentar a partir de questões básicas e práticas, não deixando ao interlocutor outra escolha que não encarar os fatos. Nesse primeiro momento, contudo, Newton rejeitou a ideia de fundar uma nova organização; a seu ver, a tarefa seria impossibilitada pelo fato de que os pretos não conheciam suficientemente bem a sua própria história. Não se deixando abalar pela recusa, Bobby Seale decidiu agir por conta própria. Criou um grupo de estudos africanos e afroamericanos no Merritt College, inicialmente denominado Black History Fact Group, depois rebatizado Soul Students Advisory Council, que conseguiu incluir a história dos negros no currículo da instituição. Em 1966, Seale organizou um evento no Merritt College que incluía um protesto contra a Guerra do Vietnã; 700 pessoas compareceram, lotando o auditório. Huey chegou no final do evento e, impressionado com a quantidade de pessoas que Seale conseguira mobilizar, decidiu unir-se ao grupo. Não demorou muito a ressurgir a ideia de fundar uma nova organização. Em setembro de 1966, considerando que chegara o momento de fazê-lo, Bobby Seale e Huey Newton se entregaram a essa tarefa no Centro de Serviços de North Oakland, onde trabalhavam. No escritório de assistência jurídica, Huey encontrou a legislação da Suprema Corte da Califórnia, que determinava

Feira de Santana: construir resistência popular e enfrentar a barbárie ronaldista 

Madrugada de segunda-feira, 26 de outubro, quinquagésimo segundo dia de resistência. Por volta das 4:20 da manhã, cerca de 60 capangas contratados e guarda municipais armados arrebentam o cadeado do portão dos fundos do canteiro de obras do BRT e invadem a ocupação na avenida Maria Quitéria, aterrorizando as e os militantes que dormiam no local, nos arrastando de dentro das barracas, quebrando nossos pertences e nos imobilizando. Na sequência, após revistas violentas, montam cercos de guardas armados nas duas entradas do canteiro de obras. Tudo sem nenhum mandado de reintegração de posse ou qualquer tipo de ordem judicial. O prefeito, José Ronaldo de Carvalho, do alto de sua arrogância e prepotência, resolveu governar Feira de Santana através da barbárie. A reprodução de um acionar político típico da Ditadura militar-empresarial que torturou, perseguiu e assassinou milhares de pessoas no Brasil não é um acaso, José Ronaldo é um político formado no ARENA, partido oficial da Ditadura, que se utiliza do mesmo modus operandi, a perseguição política, a truculência, o poder paternalista, as “grandes obras”, a modernização conservadora, o falso discurso de progresso. Nesse processo, de governar a partir da barbárie e do fascismo, José Ronaldo tem usado a guarda municipal como uma milícia armada vinculada aos seus interesses e ao seu projeto de poder, que juntamente com capangas contratados através de empresas terceirizadas, tem imposto o seu “choque de ordem”, foi assim com a invasão e desocupação ilegal das obras do BRT e seus “túneis”, na repressão covarde aos trabalhadores e trabalhadoras ambulantes e é o que se desenha para a imposição do shopping no Centro de Abastecimento. Enquanto segue dando sequência aos seus projetos que fazem de Feira de Santana uma cidade cada vez mais excludente e segregada sócio-racialmente, governando para a elite racista, seu grupo político, o setor do capital e as diversas máfias que sustentam seu governo, José Ronaldo esconde os vários processos em que está envolvido, fraudes e crimes de sua gestão, como o recente escândalo da SMT, faz da Câmara de Vereadores um tipo de “casinha de cachorros” e conta ainda com a conivência e omissão das várias instâncias da justiça burguesa e dos governos federal e estadual. Romper o cerco da ditadura de José Ronaldo é uma tarefa urgente e fundamental, que passa por fora das urnas, da farsa eleitoral e dos interesses de uma oposição igualmente oportunista, deve partir do fortalecimento das organizações populares, do empoderamento através dos instrumentos de auto-organização nas periferias, favelas, locais de trabalho e estudo e do controle territorial, é necessário criar um povo forte e protagonista, que seja capaz de enfrentar e vencer o poder. A luta combativa contra o BRT, os cinquenta e dois dias de resistência popular e autônoma, o protagonismo da juventude preta e periférica, a ação direta como método fundamental, a dinâmica permanente de formação e cultura, a afirmação intransigente de independência frente aos partidos políticos e oportunistas de toda espécie, o rechaço contra todas as tentativas de tutelar nossa ocupação, é o exemplo que confirma a certeza de nosso caminho e vocação. Somos a Feira de Santana rebelde e libertária. A resistência payayá ao colonizador branco, a rebelião de Lucas contra a escravidão, a ousadia de Maria Quitéria na guerra de independência, a rebeldia de George Américo nas ocupações de terra, a coragem de Luís Antônio Santana Bárbara contra a Ditadura. Abaixo a ditadura de José Ronaldo! Construir uma alternativa popular e libertária! Lutar e vencer! Leia também 10 anos do Vermelho e Negro e a retomada de nossa linha política revolucionária, libertária e anticolonial Versão em PDF do boletim completo.

10 years of Vermelho e Negro and the recapture of our revolutionary libertarian and anticolonial political line

In 2005, we began the mission of constructing an anarchist organization in Bahia. We started as a work space – a small study group in Feira de Santana, where militants involved in the student movement, the Black movement, community organizing and counterculture gathered. We took part in the national construction of the FAO (Forum do Anaquismo Organizado) and gave ourselves the name of our group, “Vermelho e Negro” (Red and Black). Red and Black makes reference to the traditional colors of anarchism and Exu, the Black rebellion against slavery, the rage and anticolonial uprising. Within the foundation of the study group, the organizational leap to an organized anarchist group was in 2006, as with the start of the construction of networks in other cities for the formalization of a state organization, until we lost consistency and decided to stop the activities of the Red and Black in 2011. Our activists were involved with militant struggles for the youth and working class students, women workers, those on the outskirts of town, for LGBT rights and against homophobia, for public transportation, for the right to the city, workplace organizing, struggles for Black people and against racism, in rural and urban occupations, popular education, struggles for indigenous people and dozens of solidarity activities and mutual aid. A quote from Bakunin in one of the documents from Red and Black really encapsulate the first phase of our organization, the Russian Anarchist in our first references, from “Tactics and discipline of the revolutionary party”, said that “we have for better or worse built a small party: small, in the number of men who joined it with full knowledge of what we stand for; immense, if we take into account those who instinctively relate to us, if we take into account the popular masses, whose needs and aspirations we reflect more truly than does any other group.” The experience of Red and Black has also had a fundamental importance in breaking the Eurocentric block of Brazilian anarchism, a pioneering role in the country to merge libertarian ideology with anti-colonial thought, recognizing our ancestral values and affirming the role of black people in the process of revolutionary social transformation, re-vindicating anarchism as an ensemble of forged methods in the struggle for liberation of the people and dreams of emancipation. In these 10 years since the founding, and with only a period without functioning in our organic instinct, we resumed our political line as the core founder of the Red and Black, we reaffirmed our strategy and we continue improving our methods. We do not recognize the necessity of anarchist organization with a public face like before. We see the need to promote a libertarian and anti-colonial current; in which we propose to call “quilombismo”, as synonymous to the militant anarchism that we defend, a revolutionary and libertarian concept that breaks statist logic and the pacifism of “quilombismo reformism” and the white and Eurocentric hegemony within anarchism the same time; and it fuses elements of Pan -Africanism and of “Panterismo”. [Black Panther Party tradition in the US] We continue our task, to bring down our capitalist civilization, to defeat white supremacy, the state and capital, constructing the struggles of our people on the way to liberation. Estrategia Libertaria, February 2016, Bahia, Brazil. Special Edition, 10 years of Red and Black. * Tradução do texto em inglês publicada originalmente no caderno Black Anarchism: A Reader, da Black Rose Anarchist Federation / Federación Anarquista Rosa Negra.

10 anos do Vermelho e Negro e a retomada de nossa linha política revolucionária, libertária e anticolonial

Em 2005 iniciamos a tarefa de construção de um organização anarquista na Bahia, começamos como um espaço de formação, um pequeno grupo de estudos em Feira de Santana, onde confluíram militantes envolvidos em lutas estudantis, movimento negro, atividades comunitárias e contracultura. Tomamos parte na construção nacional do Fórum do Anarquismo Organizado (FAO) e demos nome ao nosso grupo, Vermelho e Negro fazia referência as cores tradicionais do anarquismo e à Exu, a rebeldia negra contra a escravidão, a fúria e a revolta anticolonial. Entre a fundação do grupo de estudos, o salto organizativo para um grupo anarquista organizado em 2006 e o início da construção de núcleos em outras cidades para a formalização de uma organização estadual, até perdermos a regularidade e decidir parar as atividades do Vermelho e Negro em 2011, nossa militância esteve envolvida em lutas combativas da juventude e dos estudantes pobres, das mulheres trabalhadoras, nas periferias, pelos direitos LGBT e contra a homofobia, por transporte público, pelo direito à cidade, organização por local de trabalho, lutas do povo negro e contra o racismo, em ocupações urbanas e rurais, educação popular, lutas dos povos originais e em dezenas de atividades de solidariedade e apoio mútuo. Uma citação de Bakunin em um dos documentos do Vermelho e Negro sintetiza bem essa primeira fase de nossa organização, o anarquista russo e uma de nossas principais referências, dizia em Tática e Disciplina do Partido Revolucionário, que “nós, bem ou mal, conseguimos formar um pequeno partido; pequeno em relação ao número de pessoas que aderiu a ele com conhecimento de causa, mas imenso com respeito a seus aderentes instintivos, a estas massas populares cujas necessidades representamos melhor que qualquer outro partido.” A experiência do Vermelho e Negro também teve importância fundamental em romper o bloqueio eurocêntrico no anarquismo brasileiro, um papel pioneiro no país em fundir a ideologia libertária e o pensamento anticolonial, reconhecendo nossos valores ancestrais e afirmando o protagonismo do povo negro no processo de transformação social revolucionária, reivindicando o anarquismo como um conjunto de métodos forjados nas lutas de libertação dos povos e sonhos de emancipação. Leia a versão do texto em inglês publicada originalmente no caderno Black Anarchism: A Reader [migre.me/t8xF7], da Black Rose Anarchist Federation / Federación Anarquista Rosa Negra. Leia também: Construir resistência popular e enfrentar a barbárie ronaldista Versão em PDF do boletim completo.

Lançamento da edição brasileira do livro Anarquismo e Revolução Negra

A Casa da Resistência e o Coletivo Editorial Sunguilar convidam para o lançamento da edição brasileira do livro Anarquismo e Revolução Negra, do irmão e inspiração Lorenzo Kom’boa Ervin, ex-pantera negra e militante da Black Autonomy Federation, além do debate sobre os 10 anos de fundação do grupo anarquista Vermelho e Negro e lançamento da edição especial do boletim Estratégia Libertária. A atividade é no dia 30 de janeiro, sábado, ás 15h, na Casa da Resistência, que fica na rua César Martins da Silva, nº 35, no centro de Feira de Santana. O livro Anarquismo e Revolução Negra pode ser baixado gratuitamente bit.ly/1lwrfki.