Motim contra a Fome e o Desemprego de 1983: uma rebelião contra a carestia e exemplo de ação direta

Em 4 de abril de 1983, diante da grave crise econômica, desemprego e demissões em massa, carestia de vida, inflação galopante e a situação de miséria da classe trabalhadora brasileira que marcaram o período do fim da ditadura empresarial-militar fascista, estourava na zona sul de São Paulo, em Santo Amaro, o movimento que ficou conhecido como Motim Contra a Fome e o Desemprego. A rebelião que arrancou importantes conquistas foi marcada pela ação direta popular e mobilização de base a partir do Comitê de Luta contra o Desemprego e do Movimento contra a Carestia, com saques e manifestações combativas se alastrando também para o Rio de Janeiro e Minas Gerais entre os dias 4 e 8 de abril de 1983. Com saques de lojas e supermercados, em São Paulo a manifestação seguiu em direção ao Palácio dos Bandeirantes que foi atacado, com a exigência que o movimento fosse recebido pelo então governador Franco Montoro. Cerca de 100 manifestantes foram feridos e 70 presos pela PM, com mais de 400 lutadores sendo enquadrados na famigerada Lei de Segurança Nacional (LSN). O Movimento Contra o Desemprego e a Carestia arrancou do Estado a criação de 40 mil vagas de empregos em frentes de trabalho. O general fascista e então presidente da ditadura João Baptista Figueiredo foi a TV aberta acusar o movimento de atrapalhar o “processo de abertura”, uma transição pactada entre militares e a oposição burguesa para proteger os assassinos e torturadores do regime e seus patrocinadores, o empresariado e agentes do imperialismo. Os governadores de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro também vieram  à público pedir o fim da violência e calma ao povo faminto.                  Com a inflação oficial de 35% no início do ano e alimentos essenciais da cesta básica subindo até 400%, demissões em massa, cortes de investimentos públicos, situação de pobreza e miséria generalizada, a crise de 1983 tem muitos paralelos com a nossa conjuntura, assim como, os governos autoritários de Figueiredo e Bolsonaro. Elementos que hoje, agravam-se ainda mais com a Covid-19, a guerra biológica contra o povo pobre e trabalhador e a gestão desastrosa e genocida do atual governo. A disposição heroica, e em parte desesperada, do povo em luta pela sua sobrevivência é um exemplo para os dias atuais. A mobilização de massas, organização de base e os métodos insurgentes do Comitê de Luta contra o Desemprego e do Movimento contra a Carestia, assim como, a unidade de ação de diversas organizações da esquerda combativa, devem servir de guias para nossa ação nos dias de hoje, construindo comitês de base para agitação e propaganda de massas, mobilização direta e unidade de ação para avançar até a Greve Geral e a rebelião de massas, necessárias para derrotar o governo genocida Bolsonaro/Mourão, defender a vida e conquistar uma vida digna para nosso povo.         VIVA O MOTIM CONTRA A FOME E O DESEMPREGO! RETOMAR A LUTA COLETIVA, RADICAL E COMBATIVA CONTRA GOVERNOS E PATRÕES! AÇÃO DIRETA CONTRA A AGENDA NEOLIBERAL E O GOVERNO BOLSONARO/MOURÃO!   

Lutar contra o Estado policial e o terror institucional que permanecem

Em 1º de abril de 1964, generais mercenários com apoio direto do imperialismo norte-americano, da elite reacionária católica, de políticos fascistas, de grande parte da burguesia brasileira, da mídia corporativa e de setores da classe média consumavam o Golpe de Estado que institucionalizou o terror no país. Derrubado o governo de João Goulart que tentava avançar em reformas estruturais de base, sem qualquer tipo de resistência por parte do trabalhismo e da direção covarde do Partido Comunista Brasileiro (PCB), que confiavam em parte dos militares e na aliança com setores da burguesia, a brutal repressão se iniciou com assassinatos de militares que se recusaram a participar e colaborar com o golpe e se estendeu contra todos que ousaram lutar contra o novo regime de terror institucionalizado. Mas a repressão não ficou sem reposta e as lutas combativas do povo avançaram. A partir de 1968, diversas greves operárias insurgentes, grandiosas manifestações estudantis e ações heroicas das organizações armadas revolucionárias desmoralizaram e desesperaram o regime dos carrascos militares. Com a decretação do Ato Institucional Nº 5 (AI-5), em dezembro de 1968, a ditadura acabou até mesmo a oposição consentida e estendeu a repressão também contra artistas, personalidades públicas e a classe média.   Em mais de duas décadas de regime de terror a ditadura militar-empresarial corrupta e obscurantista assassinou, torturou, estuprou e sequestrou centenas e centenas de combatentes do povo, crianças, familiares de guerrilheiros também foram vítimas, mas não somente. A violência institucional e os crimes contra a humanidade foram generalizados. Enquanto fazia propaganda do seu “milagre econômico”, o regime aprofundou e produziu uma desigualdade social brutal, com carestia de vida e arrocho salarial, a dívida externa brasileira aumentou 30 vezes e os serviços públicos foram destruídos. A ditadura matou milhares de camponeses e criou diversos campos de concentração para pobres, negros, indígenas e “desajustados”, com assassinatos em massa, como no Holocausto de Barbacena, e bombardeio de povos indígenas com napalm. O regime de terror dos generais fascistas no Brasil assassinou dezenas de milhares de pessoas, muito além dos assassinatos políticos de cerca de 500 militantes e figuras públicas, que constam nos registros oficiais. No fim dos anos 1970 um novo ascenso da luta de massas com importantes greves operárias desafiaram a ditadura e os patrões, mesmo com sindicatos dominados, além de radicalizadas lutas contra a carestia de vida e o desemprego com métodos insurgentes e a fundamental participação das mulheres das periferias desgastaram o regime em crise. No início dos 1980, sob uma grande crise econômica e fortes protestos populares, o país inicia a transição negociada entre os militares e a oposição burguesa, que garantiu a impunidade para os carrascos da ditadura e seus patrocinadores e manteve a estrutura de um Estado policial sobre os pobres e a maioria negra, produzindo essa democracia dos massacres, com governos de turno e gerencias neoliberais da “direita civilizada” e da “esquerda traidora” que seguiram usando instrumentos como a Lei de Segurança Nacional, a GLO, o encarceramento em massa e a brutalidade policial, abrindo o caminho para agora sermos governados novamente por militares mercenários e genocidas, milicianos, corruptos e apologistas da ditadura.                            Nesses 57 anos do Golpe de Estado de 1º de abril, que instituiu o terror, criou e deu forma ao  Estado policial e ao fascismo institucional que permanecem nos dias de hoje, é necessário lembrar dos nossos heróis e mártires, assim como, combater o mito de que a ditadura foi enfrentada principalmente por setores progressistas da classe média e artistas, pois quem dirigiu a luta revolucionária e armada contra o regime foram os melhores filhos e filhas do povo pobre e trabalhador brasileiro, operários, camponeses e estudantes que dedicaram suas vidas à causa do povo, entres eles, Carlos Marighella, Joaquim Câmara Ferreira, Virgílio Gomes da Silva, Clemente, Iuri Xavier Pereira, Luiz José da Cunha, Osvaldão, Helenira Preta, Devanir José de Carvalho, Mário Alves, Ângelo Arroyo, Pedro Pomar, Emmanuel Bezerra, Manuel Lisboa, Manoel Aleixo, Carlos Lamarca, Zequinha Barreto, Iara Iavelberg, Luís Antônio Santa Barbara e centenas de outros militantes revolucionários que integraram organizações como a ALN, VPR, AP-ML, MR-8, MRT, PCBR, COLINA, VAR-Palmares, PCdoB/FOGUERA, Ala Vermelha e outras.     Saudamos também nesse mês de abril, a memória histórica dos 50 anos da ação de justiçamento do sádico empresário Albert Boilesen, que financiava e acompanha sessões de torturas e assassinatos de militantes, por um comando da Ação Libertadora Nacional e do Movimento Revolucionário Tiradentes, em 15 de abril de 1971. É necessário retomar o caminho da luta revolucionária e radical contra a ditadura que permanece, o Estado policial genocida e a falsa democracia dos riscos. A luta é mesma porque a ditadura é mesma, como afirmava nosso querido Carlos Eugênio da Paz, o Comandante Clemente, da ALN. JUSTIÇA POPULAR PARA OS CARRASCOS DA DITADURA E CAPITALISTAS! ABAIXO O ESTADO POLICIAL E A DEMOCRACIA GENOCIDA! TODO PODER AO POVO!   VIVA OS 50 ANOS DO JUSTIÇAMENTO DE BOILESEN! Comitê de Solidariedade Popular – Feira de Santana – Casa da Resistência – FOB – Coletivo Carranca – RECC – FOB-BA

Mianmar: golpe, massacre e resistência popular

Mianmar, a antiga Birmânia, é um país asiático que se libertou da dominação colonial inglesa apenas em 1948. Com uma população de cerca de 55 milhões de habitantes, o país que possui maioria budista e mais de 130 grupos étnicos faz fronteira com Bangladesh, Índia, República Popular da China, Laos e Tailândia. Nos anos 1950, enfrentando diversos conflitos separatistas, a rebelião dos karenes e uma guerra popular dirigida pelos comunistas, o governo foi derrubado com a liderança do militar nacionalista e anticolonialista Ne Win. O Partido do Programa Socialista da Birmânia iniciou um processo de transformação e nacionalização que ficou conhecido como a “Via birmanesa para o socialismo”, fundando em 1974 e com uma ideologia própria a República Socialista da União de Birmânia. Isolado do social-imperialismo da URSS e afastado dos países não alinhados, sob fortes tensões étnicas e com o país em colapso econômico, o governo foi derrubado por um novo golpe militar das Tatmadaw em 1988, as forças armadas do país, inaugurando uma nova fase de massacres e repressão brutal do regime, que em 1989 mudou oficialmente o nome do país para União de Myanmar e da capital de Rangum para Yangon, depois de esmagar o levante popular e estudantil que ficou conhecido como Levante 8888 do Poder Popular, por ter acontecido em 8 de agosto de 1988. Apenas em 2011, depois de terem derrotado outro movimento popular em 2007 que ficou conhecido como a “Revolução do Açafrão” e por fortes pressões e sanções do imperialismo norte-americano, os militares iniciam uma abertura democrática com a legalização da Liga Nacional pela Democracia (LND), partido pró-imperialista da líder opositora e Nobel da Paz de 1991, Aung San Suu Kyi. A LND participa das eleições de 2012 e finalmente ganha a maioria no parlamento em 2015, repetindo seu domínio eleitoral no último pleito de 2020, que o Partido da Solidariedade e Desenvolvimento da União (PSDU) ligado aos militares não aceitou o resultado, dando iniciando ao golpe de Estado. O golpe de 1º de fevereiro inaugura uma nova fase da linha dura militar em Mianmar, mesmo com o governo da Liga Nacional pela Democracia organizando massacres contra as minorias étnicas, gerindo o país segundo os interesses dos EUA e dos próprios militares que redigiram a constituição atual em 2008. As lutas entre as frações de poder e as disputas por regiões étnicas no país envolvem também os interesses e disputas internacionais na região, principalmente entre Japão e China. Os militares golpistas, que não aceitaram os resultados eleitorais, pondo fim as ilusões democrático-burguesas do partido de Aung San Suu Kyi, prenderam os principais ministros do governo e líderes do partido, desligaram os serviços de telefonia e cortaram a internet do país. Desde o início de fevereiro o povo e a classe trabalhadora de Mianmar resiste ao golpe nas ruas do país e luta contra uma repressão brutal. As organizações de trabalhadores permanecem em uma grande Greve Geral, com importante participação da Federação Geral dos Trabalhadores de Mianmar, a FGWM (na sigla em inglês). Os assassinatos de manifestantes e opositores que vem ocorrendo abertamente desde o golpe tiveram um ápice nesse sábado, dia 27 de março, após a Junta Militar ameaçar “atirar pelas costas e na cabeça” de quem fosse para as ruas protestar no Dia das Forças Armadas. Grandes manifestações combativas e heroicas tomaram mais de 40 de Mianmar e o exército deu início aos massacres, assassinando cerca de 120 pessoas, incluindo crianças. As mobilizações de massa no país que tendem a ganhar maiores volumes e combatividade diante desse novo massacre brutal e que tem uma fundamental participação da juventude birmanesa, vão tomando cada vez mais uma proporção revolucionária e aliada às organizações da classe trabalhadora podem derrotar o golpe militar fascista e superar as ilusões burguesas e o colaboracionismo da LND com os militares. Toda solidariedade internacionalista e proletária à rebelião popular em Mianmar nesse momento de dor e resistência heroica é necessária. O povo vencerá! 

Isis Dias: estudante do povo e revolucionária

Isis Dias de Oliveira foi uma militante da Ação Libertadora Nacional (ALN), estudante do povo e guerrilheira urbana que enfrentou a ditadura militar-empresarial no Brasil. Cursou Ciências Sociais na FFLCH da Universidade de São Paulo (USP), foi moradora do CRUSP e educadora popular. Sequestrada, torturada e assassinada brutalmente pela repressão em 1972. Isis recebeu treinamento em Cuba e se transferiu para o Rio de Janeiro, onde participou de ações de propaganda armada e expropriações de bancos, além de editar o jornal Ação, da ALN da Guanabara. Sequestrada no dia 30 de janeiro de 1972 junto com o militante Paulo César Massa, quando o DOI/CODI estourou um aparelho da ALN carioca, teve seu assassinato confirmado algum tempo depois por sua família, assim como Paulo César e outros dez militantes desaparecidos. Isis Dias, assim como outros estudantes do povo, fez parte da geração combativa e revolucionária de estudantes que confluíram para a luta armada contra a ditadura e o imperialismo, integrando a ALN e outras organizações revolucionárias. Abaixo reproduzimos um documento inédito, o manifesto da Frente Estudantil pela Luta Armada – FELA convocando os estudantes para ações de apoio e integração a luta revolucionária para derrubar a ditadura militar-empresarial. A FELA atuou entre 1969 e 1970 como uma frente estudantil da ALN, até ser desmantelada pela repressão e ter a maioria de seus militantes presos. COMPANHEIROS O processo revolucionário está instalado no Brasil. O papel que cabe a nós estudantes é dar todo apoio aos revolucionários. As ações revolucionárias desenvolvidas pelos guerrilheiros urbano e rurais precisam continuar em todas as frentes. A universidade é um campo de lutas dos estudantes, é uma das frentes de luta dos estudantes. A luta dos estudantes dentro da Universidade – em suas ações revolucionárias será a continuidade das lutas dos guerrilheiros – a vanguarda do processo revolucionário brasileiro. O nosso inimigo é comum, a burguesia (com sua ditadura militarista) e os imperialistas norte-americanos. A burguesia através de sua ditadura militar está tentando manipular a universidade para seus interesses. As reformas que ele tenta desenvolver na universidade através de órgãos reacionários como o Conselho Universitário, Reitoria, Conselhos Estadual e Federal de Educação, etc. tem como objetivo efetivar seus interesses monopolistas. A burguesia através de sua ditadura militar quando abalada e impedida na sua política utiliza-se da repressão e da propaganda mesquinha para impor seus princípios: é assim que assistimos impassíveis a invasão do CRUSP; a invasão e prisão de vários colegas e professores nas escolas; a cassação dos nossos professores; a imposição de cursos e conferências reacionárias ministradas por militares aos colegas de Odontologia, Medicina, Farmácia, Bioquímica, etc. Mas não será a ditadura militar, e nem os lacaios imperialistas que irão impedir o desenvolvimento da nossa revolução: ela é irreversível. Chegou agora a vez dos estudantes. Contra a força, usaremos a força e a sagacidade. Agora é o brado de alerta: olho por olho dente por dente. Aqueles que não são por nós são contra nós – e que não tentem impedir nossa passagem, pois, serão massacrados. As ações revolucionárias desenvolvidas no Campus da CUASO são gritos de alerta contra a burguesia espoliadora. Isso é só o começo. Muitas outras ações virão, pois nós representamos os interesses dos estudantes. Devemos apoiar os guerrilheiros urbanos e rurais, pois em nós estudantes está a continuidade da luta nas cidades, atacando e rasgando as poltronas dos cinemas que expõem cartazes dos companheiros revolucionários; ameaçar com telefonemas anônimos os postos de gasolina e entidades públicas e privadas que representam os interesses da burguesia e dos imperialistas americanos; fazer propaganda de todas as formas possíveis da guerra revolucionária; dar caça sem trégua aos dedo-duros que infestam a Universidade; lutar em todas as classes, laboratórios, escolas, teatros, etc. contra as imposições da ditadura; discutir incessantemente as ações revolucionárias; e quer em grupos, quer isoladamente, colaborar com essas ações revolucionárias, etc. Isto é o mínimo que nós estudantes poderemos fazer para a Revolução. TODO APOIO AOS REVOLUCIONÁRIOS!LUTA SEM TRÉGUA CONTRA A BURGUESIA NA UNIVERSIDADE!CAÇA E MORTE AOS DEDO-DUROS! Frente Estudantil pela Luta Armada – FELAOutubro de 1969, São Paulo – SP. Veja o documento original publicado pela FELA.

Autogoverno popular e federalismo: 150 anos da Comuna de Paris

Há 150 anos a capital francesa, Paris, era tomada pela insurreição de trabalhadores e trabalhadoras que deu início a experiência revolucionária de autogoverno popular e federalismo da Comuna de Paris, se espalhando também para cidades como Lion, Marselha e Tolouse. Vive la Commune! Foi o grito que estourou em 18 de março de 1871 frente a capitulação da burguesia republicana e a invasão estrangeira no contexto da Guerra Franco-Prussiana. A guarda nacional composta por trabalhadores com o apoio do movimento socialista, uma importante presença da Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT) e influências das ideias federalistas de Pierre Joseph Proudhon, toma o poder sobre a cidade de Paris. O primeiro decreto da Comuna foi a supressão do exército e sua substituição pelo povo em armas. Na descrição de Marx, “a Comuna era composta de conselheiros municipais eleitos por sufrágio universal nos diversos distritos da cidade. Eram responsáveis e substituíveis a qualquer momento. A Comuna devia ser, não um órgão parlamentar, mas uma corporação de trabalho, executiva e legislativa ao mesmo tempo. Em vez de continuar sendo um instrumento do governo central, a polícia foi imediatamente despojada de suas atribuições políticas e convertida num instrumento da Comuna, responsável perante ela e demissível a qualquer momento. O mesmo foi feito em relação aos funcionários dos demais ramos da administração. A partir dos membros da Comuna, todos que desempenhavam cargos públicos deviam receber salários de operários. [….] Como é lógico, a Comuna de Paris havia de servir de modelo a todos os grandes centros industriais da França. Uma vez estabelecido em Paris e nos centros secundários o regime comunal, o antigo governo centralizado teria que ceder lugar também nas províncias ao autogoverno dos produtores. No breve esboço de organização nacional que a Comuna não teve tempo de desenvolver, diz-se claramente que a Comuna devia ser a forma política inclusive das menores aldeias do país e que nos distritos rurais o exército permanente devia ser substituído por uma milícia popular, com um tempo de serviço extraordinariamente curto. As comunas rurais de cada distrito administrariam seus assuntos coletivos por meio de uma assembleia de delegados na capital do distrito correspondente a essas assembleias, por sua vez, enviariam deputados à delegação nacional em Paris […].” (Karl Marx, em “A Guerra Civil na França”). A Comuna de Paris terá fim após 72 dias com o massacre dos comunards na Semana Sangrenta que termina em 28 de maio de 1871. A experiência revolucionária de autogestão dos trabalhadores passa a ser um dos pilares para a construção dos modelos políticos e debates entre as correntes socialistas até os dias atuais. Louise Michel, anarquista francesa e símbolo da Comuna, que teve a fundamental participação das organizações de mulheres do povo, proclamava: “Não podem matar as ideias a tiros de canhão nem tão pouco algemá-las. O fim apressa-se tanto mais quanto o verdadeiro ideal surge, belo e poderoso, superior a todas as ficções que o precederam.” Mikhail Bakunin, um dos fundadores do sindicalismo revolucionário e dirigente da ala federalista da AIT, que teve decisiva participação na Comuna de Lyon e outros levantes populares na França entre 1870 e 1871, em seu texto “A Comuna de Paris e a noção de Estado”, de junho de 1871, afirmava que: “O socialismo revolucionário acaba de tentar uma primeira manifestação brilhante e prática na Comuna de Paris. Sou um partidário da Comuna de Paris, que, por ter sido esmagada, sufocada em sangue pelos verdugos da reação monárquica e clerical, não por isso deixou de se fazer mais vivaz, mais poderosa na imaginação e no coração do proletariado da Europa; sou seu partidário em grande parte porque foi uma negação audaz, bem pronunciada, do Estado. É um fato histórico imenso que essa negação do Estado tenha se manifestado justamente na França, que foi até agora o país por excelência da centralização política, e que seja precisamente Paris, a cabeça e o criador histórico dessa grande civilização francesa, que tenha tomado essa iniciativa. Paris, que abdica de sua coroa e proclama com entusiasmo sua própria decadência para dar a liberdade e a vida à França, à Europa, ao mundo inteiro; Paris, que afirma de novo sua potência histórica de iniciativa ao mostrar a todos os povos escravos (e quais são as massas populares que não são escravas?) o único caminho de emancipação e de salvação; Paris, que dá um golpe mortal nas tradições políticas do radicalismo burguês e uma base real ao socialismo revolucionário; Paris, que merece de novo as maldições de toda gente reacionária da França e da Europa; Paris, que se envolve em suas ruínas para desmentir solenemente a reação triunfante; que salva com seu desastre a honra e o porvir da França e demonstra à humanidade consolada que se a vida, a inteligência e a força moral retiraram-se das classes superiores, conservaram-se enérgicas e cheias de porvir no proletariado; Paris, que inaugura a nova era, aquela da emancipação definitiva e completa das massas populares e de sua solidariedade de agora em diante completamente real, através e apesar das fronteiras dos Estados; Paris, que mata o patriotismo e funda sobre suas ruínas a religião da humanidade; Paris, que se proclama humanitária e ateia e substitui as ficções divinas pelas grandes realidades da vida social e a fé na ciência; as mentiras e as iniquidades da moral religiosa, política e jurídica pelos princípios da liberdade, da justiça, da igualdade e da fraternidade, estes fundamentos eternos de toda moral humana; Paris heroica, racional e crente, que confirma sua fé enérgica nos destinos da humanidade por sua queda gloriosa, por sua morte, e que a transmite muito mais enérgica e viva às gerações vindouras; Paris, inundada no sangue de seus filhos mais generosos, é a humanidade crucificada pela reação internacional coligada da Europa, sob a inspiração imediata de todas as igrejas cristãs e do grande sacerdote da iniquidade, o Papa; mas a próxima revolução internacional e solidária dos povos será a ressurreição de Paris.” A Universidade Popular Mikhail Bakunin realizará o curso online “150 anos da Comuna: Autonomia

Paraguai: crise sanitária e insurreição popular contra o governo genocida

O povo paraguaio toma as ruas da capital Assunção, Cidade do Leste, na fronteira com o Brasil, e outras cidades do país desde o início desse mês de março para derrubar o governo neofascista de Mario Abdo Benítez, reacionário neoliberal que assim como seu aliado Jair Bolsonaro, faz uma gestão desastrosa e genocida da pandemia de Covid-19 no país. Sob os gritos de “Que se vayan todos” e “ANR nunca más” (sigla do Partido Colorado) o povo em revolta fez a polícia de Assunção recuar exigindo a saída do presidente, o fim da corrupção, a vacinação em massa da população, melhores condições para atendimentos aos doentes, visto que assim como o Brasil, o Paraguai tem seu sistema de saúde colapsado e vacinou apenas cerca de 0,1% da população até agora. Mario Abdo Benítez, filho do braço direito do ditador, pedófilo e estuprador Alfredo Stroessner, que comandou a brutal e corrupta ditadura mais longa da América do Sul entre 1954 e 1989, tentou vender seu governo como um modelo de gestão da pandemia em 2020, usando as medidas sanitárias para aumentar a repressão contra o povo pobre. Após o relaxamento das medidas no segundo semestre de 2020 o país assistiu um aumento vertiginoso dos números de internados e mortos por Covid-19, além de registrar diversos casos de corrupção com os recursos da saúde pública. Com o início das manifestações combativas do sofrido povo paraguaio, Mario Abdo que se encontra encurralado e refém da ala do Partido Colorado comandada pelo oligarca reacionário e ex-mandatário Horacio Cartes, para evitar um impeachment tenta se segurar no cargo demitindo o ministro da saúde, seu chefe de gabinete e pedindo para que outros ministros entreguem os cargos. O levante popular que demonstra a coragem e a disposição heroica do povo enfrentando a repressão acontece de forma espontânea, com atos autoconvocados pela internet, a despeito do imobilismo, como aqui no Brasil, da esquerda institucional paraguaia. O governo reacionário de Mario Abdo Benítez já havia enfrentado fortes protestos com o escândalo de corrupção envolvendo o governo Bolsonaro e a hidrelétrica de Itaipu em 2019, quando o governo brasileiro usou inclusive como moeda de troca presos acusados de relações com a organização insurgente Exército do Povo Paraguaio (EPP) que se encontravam encarcerados no Brasil. A Asociación Nacional Republicana (ANR) que é nome oficial Partido Colorado, é o mesmo partido fascista da ditadura sanguinária de Stroessner que atualmente é dominado por duas alas conservadoras, uma ligada ao ex-presidente corrupto e fascista Horácio Cartes e outra ao próprio Benítez, que é também responsável pelo assassinato brutal e desaparecimento das crianças da família Villalba. Lilian Mariana Villalba e María Carmen Villalba, ambas de 11 anos, foram assassinadas no dia 2 de setembro de 2020 em uma operação da corrupta e narcoterrorista Força Tarefa Conjunta (FTC), que também sequestrou a menina de 14 anos, Carmen Elizabeth Oviedo Villalba, vista pela última vez no dia 30 de novembro de 2020, além disso o governo Benítez prendeu Laura Villalba. Lilian e María Carmen eram filha e sobrinha de Laura, assim como, sobrinhas de Carmen Villalba. Carmen Elizabeth é filha Carmen Villalba e Alcides Oviedo, comandante do EPP e preso político. Desde a prisão, Carmen Villalba que é porta-voz do EPP e enfrenta um complô jurídico-midiático juntamente com Alcides e outros presos políticos epepistas, enviou uma carta às mobilizações populares onde que afirma que “democracia com fome, sem trabalho, sem saúde, sem terra, sem moradia não é democracia, é ditadura do capital e sua elite parasita que eterniza este mal sobre as grandes maiorias populares. Hoje, apenas um objetivo deve nos manter unidos. Todo o poder ao povo pobre mobilizado e organizado. Por uma assembleia popular permanente e mobilizada, até que colocar absolutamente todos para fora. […] Revolução ou revolução!”

Memória e justiça: 7 anos do assassinato brutal de Cláudia Ferreira

Cláudia Silva Ferreira, conhecida como Cacau, era mãe de quatro filhos e cuidava de outros quatro sobrinhos. Foi assassinada pela Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro quando caminhava para comprar comida para seus filhos na manhã do dia 16 de março de 2014. Morta pela PMERJ durante uma operação no Morro da Congonha, zona norte do Rio de Janeiro, Cláudia Silva Ferreira teve seu corpo colocado dentro da mala da viatura pelos PMs, que alegavam prestar socorro, e durante o trajeto o porta-malas do carro abriu, o corpo de Claudia caiu na pista e ficou preso por um pedaço de roupa, resultando nas imagens brutais do seu corpo sendo arrastado por 350m na estrada Intendente Magalhães. A trabalhadora negra, que era auxiliar de serviços gerais em um hospital, foi assassinada aos 28 anos. Até hoje os policiais que mataram Cacau seguem impunes, todos os envolvidos seguem trabalhando normalmente na PMERJ, sem receber qualquer tipo punição criminal ou administrativa. Durante esses 7 anos de processo, apenas uma audiência sobre o caso foi realizada. Respondem pela morte de Claudia, o capitão Rodrigo Medeiros Boaventura e os policiais Zaqueu de Jesus Pereira Bueno, Adir Serrano, Rodney Archanjo, Alex Sandro da Silva e Gustavo Ribeiro Meirelles. A LUTA DO POVO VINGARÁ SUA MORTE! CLÁUDIA FERREIRA, PRESENTE!ABAIXO O GENOCÍDIO DO POVO NEGRO NAS FAVELAS E PERIFERIAS! 

Em defesa da vida de Mumia Abu-Jamal

O ex-pantera negra e jornalista Mumia Abu-Jamal, caso mais emblemático de prisioneiro político da supremacia branca nos EUA encontra-se em uma situação de saúde grave e sua vida está em risco por conta da Covid-19 e sua condição carcerária. Vítima de uma montagem jurídico-policial da América racista, Wesley Cook (nome de batismo de Mumia) é um preso político preto desde 1981, e teve sua pena de morte convertida em prisão perpétua após mobilizações em todo o mundo. Mumia foi diagnosticado com Covid-19 no fim do mês de fevereiro desse ano e encontra-se em quarentena e com dificuldades respiratórias. O ex-pantera negra e integrante da família revolucionária MOVE, que ficou conhecido por seu programa de rádio “A voz dos sem voz” na Filadélfia (EUA), enfrenta uma condição precária de saúde na prisão, com problemas cardíacos, nos rins e na visão por ter seu tratamento negado, podendo desenvolver um caso grave de coronavírus em decorrência das precárias condições carcerárias. O movimento pela libertação de Mumia solicita a solidariedade ativa e a mobilização das organizações e militantes internacionalistas e antirracistas em defesa da vida, saúde e liberdade de Mumia Abu-Jamal, que vai completar 67 anos em abril. Segundo sua advogada de longa data, Johanna Fernandez, o movimento por sua libertação exige do governador da Pensilvânia que aplique a lei de indulto aos presos com mais 65 anos para libertar Mumia da prisão estadual em que se encontra, assim como outros presos idosos, para evitar mais mortes por Covid-19 nas prisões racistas dos EUA. LIBERDADE IMEDIATA PARA MUMIA ABU-JAMAL!FOGO NA AMÉRICA RACISTA! MORTE AO IMPÉRIO! Uma forma de apoiar Mumia é enviando mensagens exigindo sua liberdade para os e-mails do governo, justiça e sistema carcerário da Filadélfia: justice@phila.gov, jowetzel@pa.gov, brunelle.michael@gmail.com (governador Tom Wolf). URGENT SOLIDARITY IN LIFE DEFESS AND MUMIA ABU-JAMAL FREEDOM Tradução em inglês da nota pela Campanha Internacional Mobilization4Mumia Former black panther and journalist Mumia Abu-Jamal, most emblematic white supremacist political prisoner in the U.S. is in a serious health situation and his life is at risk because of Covid-19 and his prison condition. Victim of a racist American legal-police montage, Wesley Cook (Mumia’s baptismal name) is a political prisoner black since 1981, and had his death penalty converted into life after mobilizations worldwide. Mumia was diagnosed with Covid-19 at the end of February of that year and is in quarantine and breathing difficulties. Former black panther and member of the revolutionary family MOVE, who became known for his radio show ′′The Voice of the Voiceless′′ in Philadelphia (USA), faces a precarious health condition in prison, with heart, kidney and kidney problems vision for having his treatment denied, and could develop a serious case of the coronavirus due to the precarious precarious incarceration. Mumia’s liberation movement calls for active solidarity and mobilization of internationalist and anti-Racist organizations and militants in defense of the life, health and freedom of Mumia Abu-Jamal, who will turn 67 in April. According to her longtime lawyer Johanna Fernandez, the movement for her release demands Pennsylvania governor to apply the law of pardon to prisoners with 65 more years to release Mumia from the state prison she is in, as well as other elderly prisoners , to prevent more Covid-19 deaths in racist US prisons. IMMEDIATE FREEDOM FOR MUMIA ABU-JAMAL!FIRE IN RACIST AMERICA! DEATH TO THE EMPIRE! One way to support Mumia is by sending messages demanding her freedom to Philadelphia’s emails, justice, and prison system: justice@phila.gov, jowetzel@pa.gov, brunelle.michael@gmail.com (Governor Tom Wolf).

Alexandra Kollontai: revolucionária e socialista

Em 9 de março de 1952, aos 79 anos, falecia a revolucionária socialista e Comissária do Povo durante a Revolução Russa de 1917, Alexandra Kollontai. Presa como “perigosa bolchevique” antes da revolução de outubro, Kollontai tinha uma grande capacidade de oratória e mobilização. Sob sua coordenação todas as leis que discriminavam a mulher na Rússia foram abolidas e o divórcio instituído. O aborto, embora não fosse incentivado, passou a ser livremente feito em hospitais e maternidades públicas. Instituiu também um sistema de bem-estar materno e infantil e o Comissariado do Povo foi também responsável por tratar das questões e das tarefas relacionadas com a libertação das mulheres na Rússia socialista. Abaixo, um fragmento do seu texto “Os Fundamentos Sociais da Questão Feminina”, de 1907: Em primeiro lugar, devemos perguntar se um movimento unitário apenas de mulheres é possível em uma sociedade baseada em antagonismos de classe. O fato de que as mulheres que participam no movimento de libertação não representam uma massa homogênea é óbvio para qualquer observador imparcial. O mundo das mulheres é dividido – como é a dos homens – em dois campos. Os interesses e as aspirações de um grupo de mulheres se aproximam à classe burguesa, enquanto o outro grupo tem ligações estreitas com o proletariado, e suas demandas para a libertação cobre uma solução completa para a questão das mulheres. Assim, embora ambos os lados sigam o tema geral de “liberação das mulheres”, os seus objetivos e interesses são diferentes. Cada um dos grupos parte inconscientemente dos interesses sua própria classe, o que dá um colorido específico de classe para os objetivos e tarefas definidas para si. Apesar das exigências aparentemente radicais feministas, não se deve perder de vista o fato de que as feministas não podem, devido à sua posição de classe, lutar pela transformação fundamental da estrutura econômica e social contemporânea, sem a qual a libertação das mulheres não pode ser concluída. Se em determinadas circunstâncias, as tarefas de curto prazo coincidem com os objetivos finais das mulheres das diferentes classes, no longo prazo, determinam a direção do movimento e as estratégias a serem seguidas são muito diferentes. Enquanto para as feministas alcançar a igualdade de direitos com os homens sob o atual mundo capitalista representa o suficiente, por si só, os direitos iguais no tempo presente para as mulheres proletárias, é apenas um meio para progressos na luta contra a escravidão econômica da classe trabalhadora. Feministas veem os homens como o inimigo principal, os homens que tomaram injustamente todos os direitos e privilégios para si, deixando as mulheres apenas cadeias e obrigações. Para elas, a vitória é ganha quando um privilégio desfrutado anteriormente exclusivamente pelo masculino é dado ao “sexo frágil”. Já as mulheres trabalhadoras têm uma visão diferente. Elas não veem os homens como o inimigo e opressor, no entanto, elas pensam nos homens como seus pares, que partilham com elas a monotonia da rotina diária e lutam com elas por um futuro melhor. A mulher e seu companheiro do sexo masculino são escravizados pelas mesmas condições sociais, pelas mesmas odiosas cadeias do capitalismo que oprimem as suas vontades e os privam das alegrias e encantos da vida. É certo que há vários aspectos específicos do sistema contemporâneo que são um duplo fardo sobre as mulheres, como também é verdade que as condições de trabalho dos salários às vezes convertem as mulheres trabalhadoras em competidoras e rivais dos homens. Mas nestas condições desfavoráveis, a classe trabalhadora sabe quem é o culpado. As mulheres trabalhadoras, não menos do que o seu irmão na adversidade, odeiam este insaciável monstro de face dourada em que a única preocupação é extrair toda a seiva de suas vítimas e que crescem à custa de milhões de vidas e se arremete com igual ganância sobre os homens, as mulheres e crianças. São milhares de tópicos para abordar sobre a classe trabalhadora. As aspirações da mulher burguesa, por outro lado, parecem estranhas e incompreensíveis. Antipático para o coração do proletariado, não prometem à proletária esse futuro brilhante para o qual viram-se os olhos de toda a humanidade explorada. O objetivo final das proletárias não impede, é claro, o desejo que têm de melhorar a sua situação no âmbito do sistema burguês existente. Mas a realização desses desejos é constantemente prejudicada por obstáculos decorrentes da própria natureza do capitalismo. Uma mulher pode ter direitos iguais e ser verdadeiramente livre apenas em um mundo onde o trabalho é socializado, harmônico e justo. As feministas não estão dispostas a entender isso e são incapazes de fazê-lo. Elas sentem que quando a igualdade é formalmente aceita pela letra da lei será capaz de conseguir um lugar confortável para elas no velho mundo de opressão, escravidão, servidão, lágrimas e dificuldades. E isso é verdade até certo ponto. Para a maioria das mulheres do proletariado, direitos iguais aos dos homens significa apenas uma parte igual da desigualdade, mas para as “poucas escolhidas”, para as mulheres burguesas, de fato, abre uma porta para novos direitos e privilégios que até agora só foram apreciados por homens de classe burguesa. Mas a cada nova concessão que a mulher burguesa consegue terá outra arma para explorar a mulher proletária e continuar a aumentar a divisão entre as mulheres dos dois campos sociais opostos. Os seus interesses se veriam mais claramente em conflito, as suas aspirações mais evidentemente em contradição.

MULHERES DO POVO: VIVAS, LIVRES E COMBATIVAS

Comunicado Nacional da FOB no 8 de Março Ser mulher trabalhadora em um mundo patriarcal e violento não é fácil. A superexploração e a violência contra as mulheres do povo são bases fundamentais de sustentação desse sistema capitalista, patriarcal e colonial. No Brasil, a desigualdade social brutal amplia as formas de a violência contra nossos corpos. Ser mulher aqui é ter que estar constantemente com medo de sofrer abusos sexuais, pois concentramos uma altíssima taxa de estupros, assistimos (e por vezes naturalizamos) a barbárie ao ver que aqui a cada 8 minutos uma companheira é violada. Nós, mulheres do povo, convivemos constantemente com notícias de conhecidas, familiares ou amigas que foram assassinadas, uma vez que nosso país ocupa o 5º lugar em feminicídios do mundo, com uma média de 1 feminicídio a cada 9 horas. Na pandemia da Covid-19, além do aumento no número de feminicídios e violência contra a mulher durante o período da quarentena, assistimos a dura e absurda realidade de sermos o país com maior número de morte de grávidas e puérperas do mundo. O Brasil é responsável por 77% das mortes de grávidas e puérperas por Covid-19 no mundo, segundo estudo da Revista Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (IJGO, na sigla em inglês). Esses dados demonstram como o discurso sobre o direito à vida não passa de uma mentira no Brasil. O direito à vida não chega até nós, mulheres do povo, negras, indígenas, camponesas e faveladas. Vivemos porque cotidianamente lutamos pela vida, mas esse direito há muito nos foi negado. Das mulheres que morreram grávidas ou logo após o parto por Covid-19 – deixando seus filhos e filhas órfãos – 28% não chegaram sequer a dar entrada em uma UTI e 15% não receberam nenhuma modalidade de assistência ventilatória. O descaso com os trabalhadores na linha de frente da saúde é mais uma faceta da violência contra a mulher. Desde o início da pandemia, mais de um milhão de profissionais de saúde que trabalham na linha de frente nas Américas foram infectados pela doença, e quatro mil morreram, sendo a maioria mulheres. Não podemos ocultar que o capitalismo e, principalmente o avanço do modelo neoliberal, é diretamente responsável por essas mortes. A assistência às mulheres no serviço público é precária e a consequência disso é que quem mais vai morrer é justo as vítimas de sempre, mulheres negras e pobres. Para se ter uma ideia, a mortalidade materna em mulheres negras foi quase duas vezes maior do que a observada em mulheres brancas, isso sem contar as subnotificações, segundo um estudo da UFSC. NÓS, MÃES, GRITAMOS PELO DIREITO A VIDA! A hipocrisia do capitalismo brasileiro não tem limites. Vivemos em um país onde se naturaliza o controle dos corpos das mulheres proibindo o aborto através de um discurso falacioso de “direito à vida” do feto, mas que, por outro lado, pouco se importa com a vida das crianças que nascem. O direito à vida, assim como não existe para as mulheres, gestantes e puérperas pobres, tampouco é garantido para nossos filhos e filhas. Relembremos que a mortalidade infantil no Brasil é altíssima e atinge prioritariamente crianças indígenas (25,1%) e negras (27,8%), chegando em alguns estados como o Amapá, a mortalidade geral a 23%. Além da mortalidade infantil, sofremos diariamente com a brutalidade policial, o encarceramento em massa e o assassinato de crianças e adolescentes negros e pobres pelas mãos do Estado. A “bala perdida”, o “erro de um policial despreparado”, a prisão injusta, só atingem as nossas crianças e adolescentes nas periferias. Nos revoltamos por cada uma das 12 crianças assassinada pelas mãos do Estado no Rio de Janeiro em 2020. Lutaremos pela memória das mais de 2.215 crianças e adolescentes assassinadas pela polícia nos últimos 3 anos. Nós, mulheres do povo e lutadoras sindicalistas revolucionárias, nos solidarizamos com cada uma dessas mães que agora chora a morte ou a prisão de seus filhos e filhas. Que viram o Estado racista usurpando dessas crianças o seu direito à vida e a infância. Não deixaremos que o tempo apague a memória dessas vidas tão importantes e que foram tão precocemente roubadas. Não permitiremos mais que destruam nossas famílias. É por isso que lutamos contra os governos, o Estado e os patrões. Por nós, pelos nossos filhos, pelas nossas crianças, pelo direito de viver em paz! SEMEARAM MEDO, MAS COLHERÃO RESISTÊNCIA E REBELDIA Sabemos que nós mulheres somos a base de práticas seculares de apoio mútuo e suporte em comunidades trabalhadoras e pobres do Brasil. Nosso sangue e suor tem sido fundamentais para garantir a vida e a existência coletiva de nossa gente. Por isso, nós não pedimos ou imploramos por migalhas do sistema, nós exigimos nossos direitos justos e dignos. Nesse 8 de março, Dia Internacional das Mulheres Trabalhadoras, nós, lutadoras e lutadores do povo, organizadas e organizados na FOB, afirmamos: 1) Que a dor da perda de nossas irmãs, amigas, filhas e filhos não faça aumentar o medo, pelo contrário, que amplie nossa raiva e rebeldia convertida em desejo e ações para a mudança. Nós, mulheres lutadoras, temos a missão de tornar presentes as nossas companheiras e familiares ausentes. Gritar, visibilizar, lutar pelas nossas companheiras assassinadas, desaparecidas, violadas ou injustamente presas. Somos muitas Cláudias, Marianas, somos a criança de 10 anos estuprada pelo padrasto e coagida para manter a gravidez, somos, acima de tudo, aquelas que destruirão o sistema capitalista patriarcal e racista. 2) Nós lutaremos pelo direito à vida. Mas saibamos que este direito só será respeitado quando derrubarmos o Estado, o capital e a exploração machista que coloniza nosso corpo e nossa alma. Por isso, nós chamamos todas a retomar as práticas de autodefesa, que vão desde nos fortalecermos psicologicamente até criarmos redes de apoio para resistir e impedir toda forma de violência contra nós. Chamamos também todas as mulheres trabalhadoras do Brasil a aderir ao chamado da Greve Internacional de Mulheres que vem ocorrendo anualmente em diversos países como Chile, Argentina, México, Espanha e outros. Demonstraremos nossa força nos unindo, resgatando os métodos de luta combativa e provando que