HELENIRA PRETA, PRESENTE!

Hoje, 29 de setembro, fazemos memória da lutadora povo, guerrilheira do Araguaia e heroína da luta contra a ditadura empresarial-militar, Helenira Preta, assassinada brutalmente há 48 anos. Helenira Resende de Souza Nazareth, nascida em Cerqueira César, interior de São Paulo, em 19 de janeiro de 1944, filha do médico negro e comunista baiano Dr. Adalberto de Assis Nazareth, o “médico dos pobres”. Foi líder estudantil secundarista em Assis (SP), para onde sua família se mudou, e jogadora de basquete na cidade. Participou da JUC (Juventude Universitária Católica), depois da Ação Popular (AP) e posteriormente ingressou no Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Preta, como era conhecida por seus amigos e familiares, foi uma destacada oradora e importante liderança do Movimento Estudantil no país, presidente do Centro Acadêmico de Letras da USP e vice-presidente da UNE. Helenira conheceu o gosto amargo da repressão a partir de 1967 sendo fichada como “ativa fanática em subversão e filha de um ativo comunista” pelo DOPS, foi novamente presa durante o 30º Congresso clandestino da UNE de 1968, em Ibiúna, e jurada de morte pelo sádico delegado Sérgio Fleury, figura máxima da repressão policial à resistência contra ditadura fascista. Entrou na clandestinidade, vivendo em várias partes do país até ir para o Araguaia. Usando o codinome Fátima, integrou do Destacamento A das Forças Guerrilheiras do Araguaia, as FOGUERA. Helenira fazia parte do grupo de guerrilheiros que foi emboscado pelas forças repressivas em 29 de setembro de 1972. Ferida no tiroteio e metralhada nas pernas, recusou-se a entregar a localização dos companheiros aos militares, foi torturada e morta a golpes de baioneta. Guerrilheira, alegre e destemida, até hoje não foram localizados seus restos mortais. 

Osvaldão: o guerrilheiro invencível

Em 4 de fevereiro de 1974, Osvaldão, herói do povo brasileiro e lendário comandante das Forças Guerrilheiras do Araguaia (FOGUERA), impulsionadas pelo então partido de orientação maoísta PCdoB, foi assassinado pela ditatura fascista militar-empresarial, aos 35 anos de idade, e para servir de exemplo e tentar acabar de vez com o mito do guerrilheiro invencível, teve sua cabeça decepada por militares e exposta em público. Osvaldo Orlando da Costa, nasceu em 27 de abril de 1938, em Passa Quatro, Minas Gerais. Entre 1952 e 1954 morou em São Paulo, onde fez o Curso Industrial Básico de Cerâmica, o que lhe assegurou a condição de artífice em cerâmica. Mudou-se para o Rio de Janeiro, onde diplomou-se em técnico de construção de máquinas e motores pela Escola Técnica Federal no ano de 1958. Nesse período, participou ativamente das lutas estudantis. Osvaldo Orlando, do alto de seus 1,98 metros de altura, pesando cem quilos e com seus sapatos número 48 fazia parte da equipe de boxe do Botafogo, e foi campeão competindo pelo time. Também tornou-se oficial da reserva do exército brasileiro, após servir no CPOR/RJ. Ingressou no Partido Comunista do Brasil – PCdoB. Em Praga, Checoslováquia, formou-se em engenharia de minas. Osvaldão foi um dos primeiros militantes do PCdoB a chegar à região do Araguaia, por volta dos anos de 1966-67 e tinha a tarefa de criar condições para a chegada de novos militantes e mapear a área. Embrenhou-se nas matas e percorreu os rios se apresentando como garimpeiro e mariscador. Tornou-se rapidamente conhecido e amigo dos camponeses, participou de caçadas e pescarias, trabalhou na roça, tornou-se grande conhecedor das matas. Em 1969, passou a viver na margem do rio Gameleira. Foi comandante do destacamento B e dirigiu vários combates, ao lado de Dina (Dinalva Conceição Oliveira), se tornou o mais conhecido e respeitado guerrilheiro entre a população do Araguaia. Ele fazia parte do contingente guerrilheiro que rompeu exitosamente o cerco militar quando atacado por um grande número de tropas do exército em 25 de dezembro de 1973. Osvaldão, o guerrilheiro invencível que desafiou a ditatura militar-empresarial, o gigante negro que despistava os militares com botas viradas que faziam pegadas ao contrário nas marchas pelas matas, virou um encantando, uma entidade do Terecô ou Tambor da Mata, religião afro-brasileira praticada em regiões do Maranhão, Piauí e outros estados. Eternizado como herói do nosso povo. Leia os documentos produzidos durante a luta guerrilheira do Araguaia. Documentário “Araguaia, Presente!”, com depoimentos de ex-guerrilheiros e militantes políticos.

CLEMENTE, PRESENTE! Um revolucionário nunca morre, porque suas ideias permanecem vivas

Faleceu neste sábado (29/06), em Ribeirão Preto (SP), o revolucionário, músico, escritor e ex-guerrilheiro Carlos Eugênio da Paz. Conhecido pelo codinome “Clemente”, Carlos Eugênio foi o último comandante da Ação Libertadora Nacional (ALN), assumindo a tarefa após os assassinatos de Carlos Marighella e Joaquim Câmara Ferreira. Um dos quatro brasileiros condenados ‘in absentia’ pelo regime, foi também um dos poucos integrantes da luta armada que sobreviveu sem nunca ter sido preso ou torturado, exilando-se na Europa em 1973 após o desmantelamento das organizações armadas pelas forças de repressão do governo. Foi um dos últimos brasileiros anistiados, em maio de 1982. Nascido em Maceió (AL), em 23 de julho de 1950, se mudou com a família para o Rio de Janeiro, onde estudou no Colégio Pedro II. Militante da ALN, participou ativamente de inúmeras ações contra a ditadura militar, entre elas o justiçamento do industrial dinamarquês Henning Boilesen, um dos principais financiadores da Operação Bandeirantes (OBAN) e espectador assíduo de sessões de tortura contra dissidentes políticos, praticadas nas dependências do DOI-Codi. Em 1973, Clemente vai para Havana e de lá segue para a União Soviética, Iugoslávia, e depois Paris, de onde retorna para o Brasil em 1981. De volta ao Brasil, Carlos Eugênio trabalhou como professor de Música e escreveu dois livros sobre a resistência à ditadura: Viagem à luta armada (1996) e Nas trilhas da ALN (1997). “Ele se vai como viveu a vida: com coragem”, disse Maria Cláudia, sua companheira, ao informar a amigos e companheiros sobre a partida de Clemente, vítima de falência respiratória, aos 68 anos. Carlos Eugênio deixa o exemplo de coragem e solidariedade aos companheiros de uma vida de lutas. Quando chegou ao Rio de Janeiro com a família vindo de Alagoas, foi estudar no Colégio Andrews, onde seu sotaque nordestino era alvo de deboche, o que levava a brigas diárias do lado de fora da sala de aula. Começou a fazer política em 1966, aos 16 anos e no ano seguinte, estudante do Colégio Pedro II, deixou a escola para ingressar na ALN de Carlos Marighella, por quem foi instruído a servir o Exército no Forte de Copacabana, de maneira a receber treinamento militar, aprender a obedecer para no futuro aprender a comandar e entender o pensamento dos militares de maneira a se tornar um comandante militar da guerrilha armada. Bom soldado e bom atirador, chegou a ser condecorado e homenageado pelo comandante do quartel, medalha que jogou fora num bueiro de Copacabana em 1969, após sua irmã ser torturada pelos militares. Sob o codinome de “Clemente”, uma homenagem ao jogador de futebol Ari Clemente, um ex-lateral esquerdo do Corinthians e do Bangu, integrou o Grupo Tático Armado – GTA, da ALN, participando de dezenas de ações armadas em assaltos a bancos, carros-fortes – o primeiro assalto a um carro da Brink’s no Brasil – enfrentamento com as forças de segurança e panfletagem. Em 1971, levou a cabo uma tentativa de sequestro do Comandante do II Exército, o general Humberto de Souza Melo, que acabou sendo frustrada, depois que os guerrilheiros, que cercaram o general, sua família e seus seguranças na porta de uma igreja na Vila Mariana, foram eles mesmo cercados por agentes do DOI-Codi. Após uma intervenção do general para que não houvesse um morticínio ali, todos acabaram se retirando, cada grupo para seu lado. No campo da política revolucionária, foi um dos principais articuladores da campanha pelo voto nulo, lançada pela ALN para as eleições de 1970, uma vitória da guerrilha. Junto com outros companheiros, executou, dentro do carro em que ocupavam, um capitão do exército descoberto infiltrado na guerrilha. Em Nas Trilhas da ALN, relata o justiçamento com objetividade, e sem tergiversar: “Ele se cala diante do inevitável, apontamos as pistolas e executamos a sentença. Descarregamos as armas no capitão, trocamos os pentes e batemos em retirada. Sete homens jogam as cartas da vez no jogo da sobrevivência e vencem a mão”. Em 23 de março de 1971, o mais polêmico ato da ALN foi cometido por ele junto com sua então companheira e seu grande amor na vida, Ana Maria Nacinovic Correia, e dos também militantes da ALN José Milton Barbosa, Antonio Sérgio de Matos, Paulo de Tarso Celestino e Yuri Xavier Pereira: a execução do companheiro de organização Márcio Leite de Toledo, o “Professor Pardal”, em via pública, na altura do número 45 da Rua Caçapava, em São Paulo, após uma série demonstrações de fraqueza pelo guerrilheiro em ações anteriores. Em caso de deserção ou prisão, Toledo, um militante treinado em Cuba, tinha conhecimento de todos os planos, táticas e identidades dos membros da ALN. Junto ao corpo foi deixado o seguinte comunicado: “A Ação Libertadora Nacional (ALN) executou, dia 23 de março de 1971, Márcio Leite Toledo. Esta execução teve o fim de resguardar a organização. Uma organização revolucionária, em guerra declarada, não pode permitir a quem tenha uma série de informações como as que possuía, vacilações desta espécie, muito menos uma defecção deste grau em suas fileiras… Tolerância e conciliação tiveram funestas conseqüências na revolução brasileira. Ao assumir responsabilidades na organização, cada quadro deve analisar a sua capacidade e o seu preparo. Depois disto não se permitem recuos. A revolução não admitirá recuos!”. Em sua guerra particular contra a ditadura militar, este foi o único ato pelo qual Clemente veio a sentir posteriormente remorso. Menos de um mês depois, o comandante foi responsável pelo tiro de misericórdia que matou o industrial dinamarquês radicado em São Paulo Henning Boilesen, um dos principais financiadores da OBAN e espectador assíduo da tortura de dissidentes políticos dentro das instalações do DOI-Codi. Boilesen foi justiçado pelo GTA da ALN em 15 de abril de 1971, no meio da rua Barão de Capanema, também na capital paulista. A mãe de Carlos Eugênio, Maria da Conceição Coelho Paz, também foi uma integrante da ALN, recrutada pelo filho, depois de fazer um curso de enfermagem em Cuba para cuidar dos feridos da organização. Em 1974, “Joana” (codinome recebido por Maria da Conceição) foi

Luís Antônio Santa Bárbara, presente!

Em 28 de agosto de 1971 caia o “estudante da guerrilha”. Luís Antônio Santa Bárbara foi assassinado, no Buriti Cristalino, em Brotas de Macaúbas no sertão baiano, dentro da casa de José Barreto, pai dos militantes Zequinha, Otoniel e Olderico. O assassinato aconteceu após um grande cerco montado pelos organismos de repressão da ditadura fascista civil-militar para assassinar o capitão Lamarca e seus companheiros Movimento Revolucionário – 8 de Outubro, o MR-8. O professor Roberto, como era conhecido na região onde o MR-8 pretendia construir um foco de guerrilha rural, iniciou sua militância no movimento estudantil de Feira de Santana, participando da construção dos grêmios estudantis do Colégio Municipal e do Colégio Estadual. Trabalhou como tipógrafo na Gazeta do Povo e em 1967 passou a militar na Dissidência do PCB, em março de 1969 foi preso em frente ao Colégio Estadual e torturado por vários dias no 35° Batalhão de Infantaria (35-BI). Do movimento estudantil Santa Bárbara passou à luta armada, do PCB ao MR-8. Foi o primeiro a ser deslocado pela organização para a região do Buriti Cristalino e assumiu a tarefa de formar uma escola de alfabetização no povoado, onde poucos sabiam ler. Todas as tardes a casa de José Barreto se enchia de gente para ouvir o professor Roberto. A saga de Luis Antônio foi retratada por Ruy Cerqueira, no livro “Santa Barbara – O estudante da guerrilha”, publicado em 2004 de forma independente. A fictícia versão oficial diz que Santa Bárbara suicidou-se. Porém, a arma recolhida com ele era um revólver calibre 32 e as balas que o mataram saíram de um calibre 38. Outra contradição está no próprio documento da Polícia Federal na Bahia que afirma que Otoniel e Santa Bárbara foram “abatidos (…) quando reagiram à bala contra a equipe encarregada de capturá-los”. É mais um caso de assassinato que a repressão apresenta como suicídio. Em 2004 a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos, aprovou uma indenização à família baseada na Medida Provisória nº 176, depois transformada em lei, como sendo um caso de “suicídio forçado”. Santa Bárbara foi mais um lutador do povo assassinado pelas mãos ensanguentadas do Estado brasileiro. Um militante exemplar que dedicou sua vida a causa do povo e morreu por ela.